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A gestão de indicadores na USP

Sobre o autor

Aluisio Cotrim Segurado
Coordenador, Escritório de Gestão de Indicadores de Desempenho Acadêmico (EGIDA) da Universidade de São Paulo

O monitoramento de desempenho acadêmico baseado em métricas validadas constitui instrumento de indubitável relevância para a gestão universitária. Conduzido de forma sistemática e prospectiva, o acompanhamento de indicadores de desempenho retroalimenta a atuação acadêmica e contribui para o seu planejamento, instruindo a tomada de decisão de gestores e o estabelecimento de prioridades de ação.

No âmbito das universidades públicas, os indicadores de desempenho assumem especial importância como instrumento de prestação de contas à sociedade quanto ao cumprimento das diversas missões institucionais, relacionadas à formação qualificada de pessoal de nível superior, à geração de conhecimento inovador e à extensão de serviços em interação com a comunidade extrauniversitária. Ao lado disso, a prospecção de indicadores representa mecanismo valioso para aprofundar o autoconhecimento institucional, particularmente em instituições de ensino superior compreensivas de grande porte, como é o caso da USP.

As métricas de desempenho acadêmico são ainda balizadoras de comparações com instituições-referência nacionais e internacionais, sendo utilizadas em diversos sistemas de ranqueamento, não obstante a significativa variabilidade metodológica que guardam entre si, quando considerados os indicadores empregados ou os pesos a eles atribuídos pelas diversas consultorias envolvidos no processo. Apesar de tais limitações, as comparações internacionais mostram-se úteis para identificar similaridades ou complementaridades temáticas entre as universidades, de modo a subsidiar as políticas institucionais de cooperação ou de internacionalização acadêmicas.

Ciente da relevância do tema, a USP tem procurado nos últimos anos aprimorar e modernizar a gestão de seus indicadores de desempenho com vistas à busca da excelência acadêmica. Inspirada em experiências internacionais de sucesso, a alta administração da Universidade implantou o EGIDA-USP – Escritório de Gestão de Indicadores de Desempenho Acadêmico –, subordinado ao gabinete do Reitor, conforme disposto na Portaria GR no. 7256/2018 [1]. A nova estrutura assumiu em junho de 2018 a responsabilidade de coordenar a gestão de indicadores de desempenho da Universidade, com a missão de: 

  • contribuir para o aprimoramento do processo de coleta e análise de dados referentes aos vários pilares da atuação acadêmica
  • estimular o diálogo com a comunidade universitária na construção de novas métricas que possam traduzir aspectos particulares da atuação institucional de modo mais acurado
  • ampliar a transparência acerca da atividade acadêmica junto à sociedade paulista e brasileira
  • intensificar a interlocução com as consultorias de rankings acadêmicos internacionais e, por fim, 
  • responsabilizar-se pelar edição do Anuário Estatístico da Universidade.

Em atuação desde então, o EGIDA empenhou-se em se estruturar como central estratégica de inteligência. Para tal, foi inicialmente composta uma equipe de colaboradores com perfis diversificados de qualificação acadêmica, de modo a suprir as necessidades inerentes a uma tarefa essencialmente interdisciplinar. Contando com a valiosa parceria da Superintendência de Tecnologia de Informação – STI, buscou-se fazer o uso qualificado da infraestrutura tecnológica disponível na instituição, tomando como premissa a integração das diversas fontes de informação capazes de prover dados, seja a partir das bases computacionais corporativas da USP, como também de fontes externas à Universidade, em cenário de interoperabilidade [2, 3]. 

Entre as diversas lições aprendidas ao longo do processo de implantação e amadurecimento do Escritório destacam-se a importância do respaldo institucional, emanado da alta governança institucional, a contribuição de equipe técnica comprometida com a tarefa atribuída ao EGIDA e a atuação cooperativa e sinérgica do Escritório com os diversos interlocutores da Universidade, no âmbito da administração central e, de modo capilar, em unidades de ensino e pesquisa, institutos especializados e museus, entre outros.

Ao longo do processo de desenvolvimento do trabalho e amadurecimento de sua prática é possível concluir que houve nítida evolução na capacidade institucional de gestão de indicadores acadêmicos. Todavia, são diversos os desafios ainda a enfrentar. É fundamental seguir buscando aprimorar a qualidade dos dados, superando a eventual indisponibilidade, incompletude ou inconsistência dos mesmos. A garantia de uniformidade terminológica é crucial para assegurar maior consistência dos dados, razão pela qual importante esforço foi dispendido na elaboração de um glossário unificado. 

Ao lado disso, particularmente em uma Universidade com perfil compreensivo como a USP, a construção e validação consensual de indicadores de desempenho apresentam-se como um desafio contínuo. Há necessidade de buscar traduzir a atuação institucional em áreas do conhecimento bastante diversas, o que pressupõe ajuste e calibração das métricas para contemplar as especificidades de cada uma. Podem-se citar a relevância de avaliar o impacto social da Universidade nos mais variados setores como, por exemplo, da dimensão econômica, à contribuição para superação de desigualdades sociais de gênero. Da contribuição à sociedade em termos de empreendedorismo e inovação tecnológica, à amplitude e profundidade de sua atuação cultural e artística. Nesse campo, mostraram-se significativas e gratificantes as experiências obtidas com a recente participação da USP em rankings internacionais  como o UI GreenMetric World University Rankings [4], iniciativa organizada pela Universitas Indonesia, que se atem a aspectos referentes às políticas universitárias de sustentabilidade, e o Times Higher Education Impact Ranking [5], que prospecta e dimensiona de forma ampla a atuação das instituições de ensino superior em temas relacionados aos 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), acordados pelos Estados membros das Nações Unidas. Neste último, o desempenho das universidades é aferido, tanto no que concerne à geração de conhecimento, ou seja, pelo impacto da produção intelectual de pesquisadores da instituição nos vários temas relacionados aos ODS, como ainda por programas e ações desenvolvidos pela Universidade, tendo como alvos sua própria comunidade acadêmica ou a sociedade propriamente dita. Cabe, também, ressaltar a iniciativa institucional em curso, de aprofundar a reflexão institucional sobre indicadores capazes de aferir, de modo mais específico e acurado, o desempenho dos museus universitários da USP em relação à gestão dos valiosos acervos de que dispõem e, paralelamente, avaliar as iniciativas educacionais ali desenvolvidas.

Há ainda outro aspecto prioritário a discutir no trato da gestão de indicadores de desempenho acadêmico da Universidade, qual seja a imperiosa necessidade de se estabelecer um código de conduta para tal atividade, com adoção de princípios normativos acordados pela comunidade acadêmica, em consonância com o regramento legal pertinente. Deve-se, nesse contexto, zelar pela responsabilidade, eficiência e imparcialidade na gestão dos dados: responsabilidade de dar ampla transparência às fontes de dados, assegurando-se o honesto reconhecimento de suas possíveis limitações; eficiência, em relação ao rigor na definição de termos e suas premissas e no desenvolvimento de protocolos operacionais padrão (POP) para a obtenção e validação de dados; e imparcialidade no tocante à necessidade de contextualização em momentos de apresentação e discussão dos dados e à garantia de promover a revisão por pares dos mesmos, sempre que necessário, definindo-se padrões de melhores práticas para a gestão das informações.

Por fim, o momento atual que vivemos nos impõe refletir sobre as métricas de desempenho acadêmico à luz do enfrentamento da pandemia de COVID-19. A magnitude sem precedente da atual crise sanitária, acrescida das crises econômica e social que lhe sucederam, desafia hoje a Universidade a identificar novos modos de traduzir à sociedade o real impacto da atividade acadêmica na busca de soluções para desafios dessa dimensão. Torna-se imperioso buscar métricas que possam dimensionar a capacidade de resposta rápida das Universidades em momentos como este, em que a sociedade é assolada por situação de desastre ou grave ameaça. Como avaliar, por exemplo, o desempenho em atividades de ensino e formação de jovens em momento tão adverso quando a exigência de distanciamento social requer incorporação de novas tecnologias para dar continuidade ao processo ensino-aprendizagem, garantindo-se a equidade de acesso à comunidade acadêmica? Como medir a capacidade de flexibilizar tradicionais estruturas acadêmicas, de modo a propiciar novos arranjos que possibilitem redirecionamento de prioridades para a pesquisa e maior colaboração interdisciplinar? Ou em outra perspectiva, como aferir o envolvimento direto da Universidade no enfrentamento da crise, mobilizando seus serviços próprios de atenção à saúde e recursos humanos para acolher a demanda excepcional da população por cuidado? Por fim, como mensurar a capacidade da Universidade em buscar e firmar sólidas parcerias com os diversos setores da sociedade (governo, setor produtivo e organizações da sociedade civil) para enfrentar os desafios que se apresentam?

A imponderabilidade da situação epidêmica exige que a Universidade se adapte para garantir a consecução de seus objetivos institucionais, guiada por valores inalienáveis, como empatia, altruísmo, solidariedade, vontade de servir e senso de responsabilidade social. E que se possam desenvolver as devidas métricas para avaliar seu desempenho em tal propósito. 

Bibliografia

[1] Universidade de São Paulo. Gabinete do Reitor. Portaria GR 7256/2018. Dispõe sobre a criação do Escritório de Gestão de Indicadores de Desempenho Acadêmico (EGIDA). Diário Oficial do Estado. São Paulo. 30 de junho de 2018. Disponível em: http://www.leginf.usp.br/?portaria=portaria-gr-no-7256-de-29-de-junho-de-2018. [Acessado em 30 de junho de 2020.]

[2] Shimizu K, Ferreira JE, Machado R, Segurado AC. Indicadores de Desempenho Acadêmico na Universidade de São Paulo. In: Repensar a Universidade I. Desempenho Acadêmico e Comparações Internacionais. Organizador: Jacques Marcovitch. São Paulo: Com-Arte; FAPESP, 2018.

[3] Ferreira JE, Segurado A. Interoperabilidade de dados para monitoramento de desempenho acadêmico e de impacto social – Desafios da Universidade de São Paulo para o Horizonte 2022. In: Repensar a Universidade II. Impactos para a Sociedade. Organizador: Jacques Marcovitch. São Paulo: Com-Arte; FAPESP, 2019.

[4] GreenMetric World University Ranking. Disponível em: http://greenmetric.ui.ac.id/what-is-greenmetric. [Acessado em 30 de junho de 2020.][5] Times Higher Education. Impact Rankings 2020. Disponível em: https://www.timeshighereducation.com/rankings/impact/2020/overall#!/page/0/length/25/sort_by/rank/sort_order/asc/cols/undefined. [Acessado em 30 de junho de 2020.]