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III Fórum em Entrevista

Em entrevista para o Jornal da USP sobre a construção do III Fórum o coordenador do projeto, Jacques Marcovitch fala da importância do contexto e dos desafios para a consolidação do protagonismo da ciência no futuro.

Entrevista concedida a jornalista Thais Helena dos Santos em 10 de junho de 2020

Qual a importância de abordar a questão do desempenho acadêmico num contexto de pandemia?

No atual contexto as universidades vêm mobilizando suas competências para responder à urgente demanda da sociedade. Frente às crises sanitária, econômica e social todas as áreas de conhecimento contribuem no diagnóstico das causas e mitigação dos efeitos. Durante a pandemia o desempenho ganha maior visibilidade em suas atividades-fim. No ensino transparece uma pronta capacidade em ministrá-lo virtualmente, garantindo a mais completa inclusão social de seus alunos. Na pesquisa realça-se a exposição de novos conhecimentos em Ciências Exatas, Biológicas e Humanas voltadas para a solução de problemas que emanam da turbulência. Em períodos de normalidade, além da pesquisa e do ensino, a extensão responde aos anseios sociais com iniciativas igualmente ancoradas nas fronteiras do conhecimento. E, na Cultura, o apoio às Artes no espaço acadêmico e à disseminação dos valores inscritos em nosso Código de Ética e na Carta Universal dos Direitos Humanos. 

O livro “Repensar a Universidade” trata da adequação das universidades públicas paulistas às exigências de monitorar, analisar e difundir indicadores de desempenho. O que avançamos com relação a isso?

Nesta obra coletiva, em dois volumes, as universidades públicas paulistas registram iniciativas integradas por pesquisadores dedicados à concepção, estruturação e implantação de métricas relativas ao desempenho acadêmico. Discute-se ampla gama de parâmetros visando a autoavaliação dos departamentos, o aprimoramento institucional e a prestação de contas à sociedade. Cumpre destacar que a obra é a síntese conceitual de um projeto inspirado pelo Conselho de Reitores das três instituições paulistas e com o decisivo acolhimento pela Fapesp. Uma iniciativa inédita de cooperação entre universidades que totalizam 34% da produção científica em nosso país. É preciso sempre lembrar, no entanto, que indicadores são meios para fazer de uma universidade um lugar de curadoria dos saberes e de avanço da ciência, onde jovens de todas as gerações encontram, na diversidade dos tempos e na diversidade das áreas do conhecimento, os meios para construir um mundo melhor. 

Os indicadores e rankings internacionais não contabilizam as atividades de extensão (como os serviços de saúde e cultura) que são importantes na atuação das universidades públicas paulistas. Como lidar com essa questão?

Por meio de serviços de saúde mobilizados para enfrentar a pandemia são transmitidos o saber científico, a inovação tecnológica e os valores inspiradores da vida acadêmica. Neste sentido, a extensão é uma via para a universidade transferir ao conjunto social o que ela tem de mais consolidado, em termos de ensino e pesquisa. A extensão é, portanto, um meio de transmissão de cultura, entendida esta em seus múltiplos sentidos.  A extensão confere mais peso aos indicadores que reforçam os elos pesquisa, ensino, extensão e cultura. Há comparações internacionais que avaliam expressamente o impacto social que cada universidade tem de fato na sociedade. Não bastasse esta presença explícita da extensão como uma das métricas da reputação acadêmica, importa dizer que, no caso da ausência, esta lacuna prejudica a todas, e não exclusivamente as universidades estaduais paulistas. 

Dentro deste contexto que estamos abordando, o que podemos destacar de mudança na gestão das universidades nos últimos anos?

Nos últimos anos, a USP implantou um escritório para a gestão de indicadores (EGIDA) e promove mudanças nos sistemas tecnológicos de captação e disseminação de dados, modernizando-os para colocá-los em linha com os padrões globais. A Unicamp está empreendendo reformas ambiciosas de suas estruturas internas para apresentar melhores dados que alimentem diretamente o planejamento estratégico, e a Unesp implementa um plano de longo prazo e já formou uma comissão multidisciplinar especial para interação do desempenho acadêmico e as tendências evidenciadas pelos rankings.

Para viabilizar esta mudança, as universidades têm mobilizado docentes e pesquisadores sensíveis à importância do autoconhecimento institucional para a sua contínua evolução. Esta mobilização nas áreas do saber verifica-se paralelamente a uma outra, focada nas atividades-fim da universidade e articulada pelas pró-reitorias: ensino de graduação e de pós-graduação, pesquisa, extensão e cultura. As mudanças na gestão das universidades têm contribuído para aperfeiçoar a interação com agências financiadoras e iniciativas dedicadas às comparações nacionais e internacionais. Cada área-fim da universidade, em maior ou menor grau, tem também desenvolvido sua capacidade de acompanhamento institucional. 

Neste momento, em que as universidades de pesquisa estão sendo valorizadas, como manter a visibilidade depois que a crise passar?

A visibilidade de uma universidade decorre da qualidade do seu ensino, da relevância de suas pesquisas básicas e aplicadas, dos seus projetos de extensão e das suas iniciativas na esfera cultural. São as atividades realizadas ao longo de décadas, as quais, frente a uma crise respondem prontamente aos anseios gerais. Além da reconhecida contribuição na área da Saúde, ganham visibilidade as áreas que promovem o avanço digital, fator decisivo para a superação das crises em curso. Para manter a visibilidade além da crise sanitária, merecem apoio os esforços de pesquisadores que valorizam as iniciativas de interação com as redes nacionais e internacionais de pesquisa. É necessário consolidar plataformas digitais das universidades que viabilizam a cooperação com todos os segmentos da sociedade e e com outras instituições nas redes internacionais. Em paralelo, será oportuno monitorar os indicadores de resultados de pesquisas e seu impacto. Torna-se prioritário assegurar a correta atribuição institucional das publicações de pesquisa com ORCID, inclusive nos preprints e procedimentos. Finalmente, contribuirá para a visibilidade institucional permanente uma estratégia eficaz de comunicação relativa às contribuições, resultados e impactos em português e outros idiomas como o espanhol, francês e inglês.


Jacques Marcovitch, coordenador do projeto Metricas.edu é professor sênior da FEA/USP, reitor da USP (1997-2001), integra o conselho do Graduate Institute (IHEID) em Genebra.